Novembro 27, 2021
Foureaux
Pois é... Faz hoje 30 dias sem escrever aqui. Trinta dias que fiz um exame. Recolha de “material prostático” para biópsia. O urologista quis investigar mais profundamente a dita cuja, depois de uma alta no índice de PSA. Mesmo que eu desconfiasse, com quase toda segurança intuitiva, que não se passava de erro de digitação. O laboratório era o mesmo. O intervalo foi de duas semanas. Os resultados: 3,90, primeiro e 0,39, depois. Muita coincidência, pois não? Não teve jeito. O resultado sairia somente depois da minha viagem. É sobre ela que desejo falar.
Faz temo que não fazia uma viagem tão profundamente reveladora, instigante, emocionante e instrutiva. Todo isso a um só tempo, com assessoria luxuosíssima de dois amigos queridos: José Filipe Menéndez e Alexandra Pereira de Castro. Os nomes completos dos dois é bem mais extenso. A genealogia os leva a píncaros da nobreza lusitana Aqui vão apresentados pela versão mais “social” ou “resumida”. O afeto é o mesmo. A gratidão tem a mesma medida. A admiração é igualmente profunda. Uma viagem que me revelou lugares antes desconhecidos: Figueira da Foz, Montemor-o velho, Peniche, Braga, Tibães, Penela, Nazaré, Mafra, Cunímbriga, Aveiro. A casa da rua de Palhais, na Ericeira e o Paço da Quinta de Juste, em Braga foram meus endereços de referência no curso desse périplo histórico, cultural e gastronômico. Houve momentos de “transporte” cronológico: ambientes que me fizeram retornar ao século 19, ou antes, mesmo sem nunca lá ter estado, por suposto. A revelação da História por meio de detalhes, escombros, fotografias e pinturas. O enlevo espiritual de ambientes antigos conservados: palavras e telhados que guardam histórias e segredos. A beleza de altares forrados de ouro e estruturados em chinoiserie em madeira. Um luxo. Um delírio para os olhos e a alma. Os livros que li. Os vinhos que degustei. Os pratos que experimentei e as revisitações, os reencontros, as repetições. Tudo embrulhado para presente pelo afeto partilhado, a amizade confirmada a alegria que se faz de pequenos gestos e palavras mínimas. Na volta, depois de ver um filme emocionante (Adeus Christopher Robin, 2018, Simon Curtis) chorei. Um pouco pelo efeito do filme (embebido em três cálices de Vale dos Cavalos, um tinto do Douro, especial, de respeito) e mais por conta da saudade que senti de mamãe, escrevi umas linhas. Que pretendo se convertam num ou dois poemas. Só o tempo dirá!
Vejo o oceano
a meus pés, ainda que em suspenso
entre nuvens pequenas, picadas
pingos de mágica
a bordar o tempo franzido pelo vento
água muita
como a imaginação que voa
saudosa
da brisa do rio em sua foz
porta do infinito
mar
Se o mar, lá embaixo, falasse
o que diria de si
e do mundo que o rodeia,
calmo e atento,
pronto para o avanço?
Ah... o que diria do tempo
da saudade e do sonho
num vai e vem que domina
a quase tudo que rodeia
porque, de fato, domina
e assim
deve dizer nada
como a lágrima que escorre,
também silente,
da saudade
que no mar se completa e contempla.