Outubro 27, 2021
Foureaux
Há momentos em que eu penso que estou perdendo o juízo. Não sou tão presunçoso para considerar que o que eu escrevo é melhor do que outros escrevem. No entanto, há coisas que leio, coisas “premiadas” que... por favor... Nem deixando toda a presunção de lado, sou capaz de reconhecer alguma “qualidade” no que leio. Mas não dou tratos a esta bola. Deixo passar e continuo “cometendo” meus poemas. Como os que seguem abaixo. Há quem critique o fato de compartilhar poemas inéditos. A roubalheira é grande. Não me importo. Sigo tentando. Quem sabe um dia...
Credo
Juntei duas palavras bonitas,
daquelas de que gosto muito.
Juntei-as numa frase sonora.
E acreditei ter escrito um poema.
À direita, o rapaz de barba e óculos não gostou,
disse que não tinha substância.
A senhora vetusta e grisalha,
do alto de sua erudição,
concluiu que o poema era o resultado,
apenas o resultado de um moedor de palavras.
A mocinha, loura e espevitada,
riu, e não disse nada,
mas escreveu à colega comentando
que o poema era fraquinho.
O senhor de óculos de tartaruga
franziu o sobrolho,
sério, vaticinou: em futuro.
Confuso, recolhi-me,
e nunca minha insignificância foi tão aconchegante.
Fechei o caderno e fui dormir.
Quem sabe um dia,
escolho outras duas palavras e as junto
numa frase sonora,
acreditando que ainda posso escrever um poema.
Reverso
Por duas vezes, apenas duas vezes.
Este foi o número de ocorrências
fatídicas, ambas
e sorrateiras
como as duas mulheres de fala mansa.
Alcoviteiras de livros, juntaram-se
e num conluio perverso
acertaram as pontas de um novelo
e o cara de pug venceu:
uma delas deu sua benção,
a outra aquiesceu.
Depois, a outra não se conteve
e, fria, melíflua e sagaz
soltou no ar a dúvida:
com isso não se brinca.
O dedo de Midas que, ao revés,
tudo derrete e reduz a pó, sem dó.
Fiel à sua conduta, criou o desequilíbrio necessário
para outrem, se locupletando, afirmar-se.
Dois passos.
Dois dias.
A população, por inteiro a esperar pela conclusão.
Indiferença e tédio.
Mais tempo se passa e as duas, ainda alcoviteiras
de livros, agora, empoeirados.
O reencontro para mais um tirocínio.
Da incômoda resolução do passado,
a ideia de definição do futuro
alheio.
Incompetência, ignorância, despreparo,
imaturidade.
Os epítetos, tal petardos,
podiam derrubar muros altos.
Mas não, apenas muretas caíram
no vazio da denúncia irresponsável que levou ao sucesso alheio.
Com alheia era sua vontade.
Nada como sonhado,
um dia depois de outro e bum!
Tudo acabado.
as donas caladas. Os dois mequetrefes mudos.
O mundo girando entre letras garrafais do sucesso.
E nenhum poema escrito.