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As delícias do ócio criativo

As delícias do ócio criativo

10.03.25

Impacto

Foureaux

Acabei de ler o poema que segue. Impactado. Resolvi compartilhar, sem mais palavras.

Quiéreme entera

[Poema - Texto completo.]

Dulce María Loynaz

Si me quieres, quiéreme entera,
no por zonas de luz o sombra…
Si me quieres, quiéreme negra
y blanca. Y gris, y verde, y rubia,
y morena…
Quiéreme día,
quiéreme noche…
¡Y madrugada en la ventana abierta!

Si me quieres, no me recortes:
¡Quiéreme toda… O no me quieras!

15.02.25

Entrevista

Foureaux

Entrevista.jfif

Acabei de ver (extremamente comovido) uma entrevista que não sabia ter sido feita (A gente precisa mesmo saber de tudo?). Uma entrevista. (Alta Definição | Adriana Calcanhotto) Coisa simples. Um interlocutor inteligente, sagaz, sutil, delicado e incisivo. É possível ter todas estas qualidades reunidas num só ato... o de entrevistar? A entrevistada é Adriana Calcanhoto. O entrevistador é Daniel Oliveira, da SIC, um canal televisivo de Portugal. Quando se digita o nome do programa na barra de procura do google (Hoje em dia a gente não procura quase mais nada sem o seu socorro...) aparece o seguinte: “Alta Definição é um programa televisivo da SIC conduzido por Daniel Oliveira em que semanalmente faz uma entrevista, numa abordagem intimista, a um convidado central. As entrevistas são gravadas em alta definição, num local especial escolhido pelo entrevistado.” À parte o fato de ter uma certa birra da cantora por conta de algo que se passou logo depois de 2015... Eu tinha concluído o segundo estágio de pós-doutoramento na Universidade de Coimbra, supervisionado pela filha de uma personalidade única das terras portuguesa – António Arnaut. Era a Ana Paula Arnaut. Foi ela que me deu a notícia de que Adriana Calcanhoto estava em Coimbra por um período de seis meses. Ia uma vez por mês à universidade para desenvolver um, seminário sobre poesia. despesas pagas. Eça, a supervisora. estava indignada pois os vencimentos docentes, àquela altura, beiravam o aviltamento, segundo ela. E lá estava a “cantorazinha” a ganhar num mês o que os locais suavam para ganhar num ano. A levar ao pé da letra a notícia, chegava mesmo a aviltar. Um horror. Daí a birra. No entanto, não dá para esquecer a emoção de ver a cantora em seu début profissional e artístico em Santa Maria da boca do monte, no Rio Grande do Sul, nos idosa de 1992 ou 93, já não me recordo com certeza. Trajando terninho azul, risca de diz, aberto nos ombros e nos joelhos – quando ela se sentou as pernas se desnudaram e quando se movimentava no exercício de violonista ou nos trejeitos afeitos à interpretação das músicas que cantava os ombros tinham a sua vez de fazer o mesmo. Um encantamento sentido e gozado da primeira fila no salão de festas do Itaimbé, então, o melhor e maior hotel da cidade. Eu, carne fresca no mercado, ainda descobria os segredos da cidade – confesso que mesmo depois dos cinco anos lá vividos, a maioria deles me é desconhecida... – e fui ver o show acompanhado de uma mulher extraordinária a quem amei desde o primeiro momento em que a vi: Maria Luíza Furtado Kahl. A mesma emoção se repetiu, quando, ainda em Coimbra, fui ver uma apresentação da Adriana Calcanhoto no teatro da Universidade. Foi o prelúdio do mencionado seminário. Chorei, como chorei durante a entrevista. Será que é mesmo necessário explicar com palavras esse tio de experiência...?

Adriana.jfif

 

13.02.25

Do sopro do minuano

Foureaux

 

Passarinho.jfif

Há um poeta que me causa espécie. Não sei dizer o porquê. Sim esta palavra é acentuada pois tem valor de um substantivo. Basta consultar a gramática normativa da Língua Portuguesa (qualquer que seja o autor) que, entre mortos e feridos, esta verdade científica vai prevalecer. É, de fato, no campo dos estudos linguísticos, uma verdade científica. Por mais que uns e outros queiram desautorizar esta veracidade. Pois bem. O poeta é Mario Quintana. Conheci-o rapidamente em Santa Maria, nos idos de 90 do século passado. Não cheguei a ser apresentado a ele – havia muitos papagaios de pirata em volta, alvoroçados. Um professor do mesmo departamento em que eu trabalhava era amigo dele e dizia ser pessoa muito afável. Depois, um ex-jogador de futebol – pasmem! – o Falcão, acolheu o poeta, então desalojado. Houve até um rumoroso boato dizendo que Mario quintana foi achado no meio da rua, junto com suas malas, pelo jogador e, então, acolhido. Bem... línguas de matildes sempre existiram e dificilmente serão extirpadas da face do planeta. O que me interessa aqui, no entanto é que, no ímpeto de uma ideia que me ocorreu para um livro de poesias, lembrei-me de um “poeminho” do autor gaúcho. Seu título? “Poeminho do contra”:

Todos esses que aí estão
Atravancando meu caminho,
Eles passarão...
Eu passarinho!

Para o meu livro, me veio à mente uma paródia:

Seja à mesa ou no balcão

acompanhado ou sozinho

eles tomam chimarrão

eu cafezinho!

Por óbvio, não realizei plenamente a paródia, pois que o sentido do poema “original” não permanece nos versos parodiados, como parece ser o princípio que rege este procedimento poético. No entanto, gostei da brincadeira e já adianto um dos textos que vai compor o futuro livro. O título deste, guardo em “segredo de estado” ... as interpretações são muitas. Há até alguém que afirme que o poeta fazia um protesto de cunho político-partidário... Ainda que imaginação (ainda) não paga imposto e (ainda) não é crime.

Saudades de algumas coisas vivenciadas no período santamariense de minha carreira docente.

Quintana.jfif

 

12.02.25

Andalucía!

Foureaux

Lorca.jfif

Espanha. Um país encantador. Sua capital é vibrante e seu interior, mágico, sedutor, como Sevilha. Sofisticado como Toledo. Ancestral como Segóvia. Imponente como Salamanca. Impressionante como o Valle de los caídos. Inspirador como Ávila. Ainda quero voltar a este país. Nele nasceu um homem que me impressiona, mesmo que eu não saiba colocar ame palavras o real motivo. Apenas me impressiona. Punto i basta. Falo de Federico García Lorca. Eu costumava falar “Lórca”, até o dia em que ouvi dizer que a pronúncia correta é “Lôrca”. Ainda não voltei lá para perguntar a um nativo. Reservo-me o direito de não me dirigir a um scholar local para sabê-lo. A empáfia me incomoda. Não ando atrás de verdades absolutas, por inexistentes, obviamente! Pois... Garcia Lorca (ó ou ô, aqui tanto faz...!) escreveu muito. Dentre suas várias obras está um poema que serviu de mote, se não, de pedra fundamental (matéria mesmo) para um número musical apresentado na sessão do prêmio Goya no corrente ano ((4) DELLAFUENTE- VERDE (GOYA 2025) Homenaje García Lorca - YouTube). Um número de canto e dança. A letra é um poema de Lorca. Identificado pelo google como “Verde que te quiero verde”. A considerar o que diz a edição das obras completas do escritor espanhol, publicada pela Aguilar, de Madri, em 1957, o poema leva por título “Romance somnanbulo”. É terceiro poema da série de 15 que compõem seu livro Romancero gitano (1924-1927). No google, para além do nome que toma o primeiro verso como título, consta que a data de publicação é 1928. Abstenho-me da obrigação de explicar o porquê, dado que o desconheço. as pessoas a quem é dedicado – não faço ideia de quem sejam – são as mesmas – na edição que tenho e no texto da rede que utilizo aqui literalmente iguais, por sorte!). Pensei em fazer uma tradução para colocar aqui, mas a síndrome macunaímica de que sou constante vítima, impossibilitou-me. Segue o poema no original

Romance somnanbulo

Federico García Lorca

Gloria Giner
y
A Fernando de los Ríos

Verde que te quiero verde.
Verde viento. Verdes ramas.
El barco sobre la mar
y el caballo en la montaña.
Con la sombra en la cintura,
ella sueña en su baranda,
verde carne, pelo verde,
con los ojos de fría plata.
Verde que te quiero verde.
Bajo la luna gitana,
las cosas la están mirando
y ella no puede mirarlas.

*

Verde que te quiero verde.
Grandes estrellas de escarcha
vienen con el pez de sombra
que abre el camino del alba.
La higuera frota su viento
con la lija de sus ramas,
y el monte, gato garduño,
eriza sus pitas agrias.
Pero ¿quién vendrá? ¿Y por dónde?…
Ella sigue en su baranda,
verde carne, pelo verde,
soñando en la mar amarga.
—Compadre, quiero cambiar
mi caballo por su casa,
mi montura por su espejo,
mi cuchillo por su manta.
Compadre, vengo sangrando,
desde los puertos de Cabra.
—Si yo pudiera, mocito,
este trato se cerraba.
Pero yo ya no soy yo,
ni mi casa es ya mi casa.
—Compadre, quiero morir
decentemente en mi cama.
De acero, si puede ser,
con las sábanas de holanda.
¿No ves la herida que tengo
desde el pecho a la garganta?
—Trescientas rosas morenas
lleva tu pechera blanca.
Tu sangre rezuma y huele
alrededor de tu faja.
Pero yo ya no soy yo,
ni mi casa es ya mi casa.
—Dejadme subir al menos
hasta las altas barandas;
—¡Dejadme subir! dejadme
hasta las verdes barandas,
Barandales de la luna
por donde retumba el agua.

*

Ya suben los dos compadres
hacia las altas barandas.
Dejando un rastro de sangre.
Dejando un rastro de lágrimas.
Temblaban los tejados
farolillos de hojalata.
Mil panderos de cristal
herían la madrugada.

*

Verde que te quiero verde,
verde viento, verdes ramas.
Los dos compadres subieron.
El largo viento, dejaba
en la boca un raro gusto
de hiel, de menta y de albahaca.
¡Compadre! ¿Dónde está, dime,
dónde está tu niña amarga?
¡Cuántas veces te esperó!
¡Cuántas veces te esperara
cara fresca, negro pelo,
en esta verde baranda!

*

Sobre el rostro del aljibe
se mecía la gitana.
Verde carne, pelo verde,
con ojos de fría plata.
Un carámbano de luna
la sostiene sobre el agua.
La noche se puso íntima
como una pequeña plaza.
Guardias civiles borrachos
en la puerta golpeaban.
Verde que te quiero verde.
Verde viento. Verdes ramas.
El barco sobre la mar.
Y el caballo en la montaña.

16.01.25

Poesia

Foureaux

OIP.jfif

Ia (do verbo "não vou mais"...!) partilhar hoje um texto do Arnaldo Jabor que a Glória, amiga dileta, enviou-me ano passado, ainda em outubro. Desisti quando ouvi a declamação do poema que segue no youtube. Gosto imenso de Fernando Pessoa, sobretudo de três de seus quatro mais afamados heterónimos (como se escreve por lá, do outro lado do grande lago): Alberto Caeiro, Álvaro de Campos – preferidíssimo – e o ortônimo, por suposto.). Há sempre uma beleza invulgar em versos tão aparentemente banais e rasteiros. Há que ter olhos de ver e ouvidos de ouvir, porque poesia é Literatura para se ler em voz alta, sempre! Uživati!

 

Ah; querem uma luz melhor que a do sol!

Querem campos mais verdes que estes!

Querem flores mais belas que estas que vejo!

A mim este sol, estes campos, estas flores contentam-me.

Mas, se acaso me descontento,

O que quero é um sol mais sol que o sol,

O que quero é campos mais campos que estes prados,

O que quero é flores mais estas flores que estas flores —

Tudo mais ideal do que é do mesmo modo e da mesma maneira!

Aquela coisa que está ali estava mais ali que ali está!

Sim, choro às vezes o corpo perfeito que não existe.

Mas o corpo perfeito é o corpo mais corpo que pode haver,

E o resto são os sonhos dos homens,

A miopia de quem vê pouco,

E o desejo de estar sentado de quem não sabe estar de pé.

Todo o cristianismo é um sonho de cadeiras.

E como a alma é aquilo que não aparece,

A alma mais perfeita é aquela que não apareça nunca —

A alma que está feita com o corpo

O absoluto corpo das coisas,

A existência absolutamente real sem sombras nem erros

A coincidência exacta (e inteira) de uma coisa consigo mesma.

 

(12-4-1919 – “Poemas inconjuntos”. Poemas Completos de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa – Recolha, transcrição e notas de Teresa Sobral Cunha – Lisboa: Presença, 1994.) 1ª versão inc.: Poemas de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa. (Nota explicativa e notas de João Gaspar Simões e Luís de Montalvor. Lisboa: Ática, 1946.)

 

24.11.24

Homenagem

Foureaux

baixados.jfif

A postagem de hoje é uma homenagem a um amigo querido que, como diz o adagiário popular, foi desta para melhor, o Gilberto Fladimar Viana. Foi Diretor do Gabinete de Pesquisa do Cal – Centro de Artes e Letras – da UFSM, que eu, íntima e jocosamente, chamava de universidade federal sado masoquista. Trabalhei cinco anos nesta universidade localizada em Santa Maria-RS. Dos cinco anos, quatro foram de convivência quase diária com o “negão”, como a gente costumava se dirigir a ele, com amizade, afeto, respeito, reconhecimento, alegria e desconcentração. Os tempos eram outros. A patrulha da ignorância e da chatice ainda não tinham alcançado a adolescência... de lá pra cá, regrediram... mas isso é uma outra história. O Gilberto... churrasqueiro de marca, aplicado, responsável e alegre. Deixa saudades. Pare ele, minha singela homenagem...

 

Quando vier a primavera, 
Se eu já estiver morto, 
As flores florirão da mesma maneira 
E as árvores não serão menos verdes que na primavera passada. 
A realidade não precisa de mim.

Sinto uma alegria enorme 
Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma.

Se soubesse que amanhã morria 
E a primavera era depois de amanhã, 
Morreria contente, porque ela era depois de amanhã. 
Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo? 
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo; 
E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse. 
Por isso, se morrer agora, morro contente, 
Porque tudo é real e tudo está certo.

Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem. 
Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele. 
Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências. 
O que for, quando for, é que será o que é.

 

CAEIRO, AlbertoPoesia (Poemas Inconjuntos), ed. Fernando Cabral Martins, Richard Zenith. Lisboa: Assírio & Alvim, 2001, p. 109

 

06.11.24

Acréscimo

Foureaux


Na postagem de ontem, esqueci-me, de acrescentar comentário sobre o que afirmei acerca dos dois primeiros versos do poema do Antônio Cícero: “No dia em que fui mais feliz / eu vi um avião cruzar o seu olhar até sumir”. Estou assumindo a ideia de que se trata de dois versos apenas. Como letra de música, na gravação de Adriana Calcanhoto (aliás, vou perguntar ao professor google se mais alguém gravou a mesma canção que faz jus ao poema), dependendo do site em que aparece podem ser mais versos, como por exemplo “No dia em que fui mais feliz / eu vi um avião / cruzar o seu olhar até sumir”, ou ainda “No dia em que fui mais feliz / eu vi um avião cruzar o seu olhar / até sumir”. Ao fim e ao cabo, a posição dos versos, aqui, não importa. A forma definitiva está no livro do poeta, já publicado. Quem quiser que o consulte. O que desejo expressar é a confirmação de minha assertiva. Trata-se, a meu ver, da mais acachapante declaração de amor de que tenho notícia. Vejam, que disse “acachapante”, não disse “única” ou “definitiva”. Porque as opiniões são diversas... e mudam. As interpretações não se prendem a grilhões ideológicos e cada um lê como quer, porque o poeta não pode, isso, controlar. Então... A imagem criada por Antônio Cícero fala de um fenômeno ao qual pouco se presta atenção. O avião que cruza o céu é percebido pelo eu lírico nos olhos de quem está à sua frente ou ao seu lado, não importa. Na leitura que faço, os olhos são do ser amado que olha para o céu e vê o avião. O eu lírico olha para o olho de seu/sua amado/a e vê neles o reflexo do avião que cruza o céu. se isto não é lindo, não sei o que é. Se isso não expressa amor infinito, inclusive pela ilação possível com “céu”, também, não sei do que se trata. Lacan já dizia que o sujeito deseja ser o que ele vê refletido nos olhos de sua mãe, no momento da amamentação. Disse isso, em outras palavras, de outra forma, mas, salvo equívoco meu, foi isso que ele disse. Logo, no poema, Antônio Cícero, tendo ou não procurado saber do que disse Lacan antes de escrever o poema, diz, em outras palavras, a mesma coisa. A analogia procede, tanto que é possível pensar que, inconscientemente, o poeta já percebe o que explicou o psicanalista – mesmo que, cronologicamente, a ordem não seja esta. De qualquer maneira, resta afirmar, confirmar e asseverar a beleza dos versos e sua acachapante forma de declaração de amor. E tenho dito!

PS: falando em poesia, recebi de uma amiga virtual (Natalia Castelluccio) um acróstico para o mês de novembro, em três línguas (Adoro tradução e suas artimanhas, suas surpresas e suas epifanias!). Fiz algumas adaptações, que julguei necessárias, e compartilho:

ACROSTICO DI NOVEMBRE

Nuove
Occasioni
Vibrano
Eternamente
Mentre
Bramiamo
Regole
Eccezionali
NOVEMBER
’s ACROSTIC
New
Occasions
Vibrate
Eternally
Meanwhile
Be craved
Exceptional

Rules
ACROSTICHE DE NOVEMBRE

Nouveau

Occasions

Vibrent

Éternellement

Momentanément

Bavardons

Règles

Exceptionnels

05.11.24

Declaração de amor

Foureaux

OIP.jfif

Quando dei aulas sobre Literatura Brasileira, sobretudo nos últimos semestres (nos cinco anos finais de minha “carreira” – por questões meramente burocrático-administrativas – lecionei apenas Literatura Portuguesa e Literatura Comparada), assim como, quando lecionava outras matérias literárias, lia poemas (inclusive) em sala de aula. Isso era considerado perda de tempo e falta de didática por alguns doutos “pares” que faziam cara de chacota quando isso era mencionado. Sim, eu lia textos literários em sala de aula!!! Heresia! Anátema! Fosse nos domínios do tio Sam... shame on you!, era o que eu ouviria... Bom... Sempre procurei desmerecer as “bocas de matildes” e continuei lendo poemas, contos, trechos de romances, etc. em minha aulas. Numa delas, apresentei esse poema – lido primeiro, escutado depois – para afirmar, de cara, que seus dois primeiros versos são a mais acachapante declaração de amor de que tenho notícia. Adoro o termo “acachapante”: diz tudo, é sonoramente forte, expressivo, vigoroso. Fiquei com o poema. procurem pela gravação de Adriana Calcanhoto (desconheço se há outra... Caso haja, não vai superar a da cantora gaúcha). Uživati! É bom proveito em croata...

Inverno

No dia em que fui mais feliz
Eu vi um avião
Se espelhar no seu olhar até sumir
De lá pra cá não sei
Caminho ao longo do canal
Faço longas cartas pra ninguém
E o inverno no Leblon é quase glacial
Há algo que jamais se esclareceu:
Onde foi exatamente que larguei
Naquele dia mesmo
O leão que sempre cavalguei?
Lá mesmo esqueci
Que o destino
Sempre me quis só
No deserto sem saudade, sem remorso só
Sem amarras, barco embriagado ao mar
Não sei o que em mim
Só quer me lembrar
Que um dia o céu
Reuniu-se a terra um instante por nós dois
Pouco antes do Ocidente se assombrar

(CÍCERO, Antônio. “Inverno”, inGuardar. Rio de Janeiro: Record, 1996.

 

13.10.24

Contrastes

Foureaux

Conttraste.jfif

 A postagem de hoje é longa. Azar de quem não gosta! Continuo com a mesma convicção da adolescência: domingo é o dia mais bobo da semana. O menos querido por mim, sobretudo depois de algumas décadas de exercício docente... Uma chatice. No entanto, mesmo na bobagem é possível encontrar alguma coisa que chame a atenção, que seja interessante, que preste. Então, resolvi compartilhar dois textos. Eles, juntos, constituem uma contradição. Não digo paradoxo porque esta palavra soaria muito forte, quase falsa no contexto. O primeiro recebi no whatsapp hoje pela manhã, O segundo, já conhecido, vi en passant numa rede social dessas que existem por aí. É um vídeo com o poema declamado pelo Pedro Lamares. Tanto poema quanto locutor dispensam comentários. Vai-se entender a cabeça de outrem...

 “Espetacular este levantamento

Sumiko Hanada: matematicamente insustentável

1 Presidente da República

1 Vice-presidente da República

1 Presidente Câmara federal

1 Presidente Senado Federal  

11 ministros do STF

81 Senadores

513 Deputados federais

27 Governadores

27 Vice-Governadores

27 Câmaras estaduais

1.049 Deputados estaduais

5.568 Prefeitos

5.568 Vice-prefeitos

5.568 Câmaras municipais

57.931 Vereadores

Total: 70.794 políticos (não estamos falando de nenhum partido de forma específica) + 11 do STF ("políticos" também).

12.825 - Assessores parlamentares Câmara Federal (sem concurso)

4.455 - Assessores parlamentares Senado (sem concurso)

27.000 – Assessores parlamentares Câmaras Estaduais (sem concurso – estimado/por falta de transparência)

600.000 – Assessores parlamentares Câmaras Municipais (sem concurso – estimado/por falta de transparência)

Total Geral: 715.074 funcionários não concursados

Gasto:

248 mil por minuto;

14,9 milhões por hora;

357,5 milhões por dia;

10,7 bilhões por mês;

Gasto Total: acima de 128 BILHÕES por ano + 6 BILHÕES do FUNDO PARTIDÁRIO. Além disso, deve-se computar o rombo na previdência social com suas aposentadorias alienígenas.

35 Partidos registrados no TSE + 73 partidos em formação.

As perguntas cabíveis diante dessa situação são as seguintes:

Será que a reforma da Previdência é a única prioridade nacional?

- Como é que nós deixamos chegar a esse ponto?

- E até quando?

*Fonte: Banco Mundial*

O Brasil tem a maior carga tributária do mundo, para pagar a

MAIOR CORRUPÇÃO DO MUNDO

Tributos no Brasil – uma vergonha!!!

Medicamentos      36%

Luz.                   45,81%

Telefone            47,87%

Gasolina            57,03%

Cigarro              81,68%

PRODUTOS ALIMENTÍCIOS BÁSICOS

Carne bovina       18,63%

Frango                 17,91%

Peixe                   18,02%

Sal                       29,48%

Trigo                    34,47%

Arroz                    18,00%

Óleo de soja        37,18%

Farinha                34,47%

Feijão                  18,00%

Açúcar                40,40%

Leite                    33,63%

Café                    36,52%

Macarrão            35,20%

Margarina            37,18%

Molho tomate      36,66%

Biscoito               38,50%

Chocolate            32,00%

Ovos                    21,79%

Frutas                  22,98%

Álcool                  43,28%

Detergente           40,50%

Sabão em pó      42,27%

Desinfetante        37,84%

Água sanitária     37,84%

Esponja de aço   44,35%

PRODUTOS BÁSICOS DE HIGIENE

Sabonete                 42%

Xampu                 52,35%

Condicionador    47,01%

Desodorante       47,25%

Papel Higiênico   40,50%

Pasta de Dente   42,00%

MATERIAL ESCOLAR

Caneta                48,69%

Lápis                   36,19%

Borracha             44,39%

Estojo                  41,53%

Pastas plásticas  41,17%

Agenda                44,39%

Papel sulfite         38,97%

Livros                   13,18%

Papel                   38,97%

BEBIDAS

Refresco em pó   38,32%

Suco                    37,84%

Água                    45,11%

Cerveja                56,00%

Cachaça              83,07%

Refrigerante        47,00%

Sapatos               37,37%

Roupas                37,84%

Computador        38,00%

Telefone Celular   41,00%

Ventilador            43,16%

Liquidificador      43,64%

Refrigerador        47,06%

Microondas         56,99%

Tijolo                    34,23%

Telha                    34,47%

Móveis                 37,56%

Tinta                    45,77%

Casa popular       49,02%

Mensalidade Escolar 37,68% (ISS DE 5%)

ALÉM DESTES IMPOSTOS, VOCÊ PAGA

- DE 15% A 27,5% DO SEU SALÁRIO A TÍTULO DE IMPOSTO DE RENDA;

- PAGA O SEU PLANO DE SAÚDE,

- O COLÉGIO DOS SEUS FILHOS,

- IPVA,

- IPTU,

- INSS,

- FGTS

- ETC.

Desde maio de 2024, são 39 pastas ministeriais, sendo 31 ministérios, quatro secretarias e quatro órgãos equivalentes a ministérios.

O Brasil precisa de atitude do povo!

Somos 208 milhões de Brasileiros....sendo sacaneados por 600 políticos de Brasília...

- Sem querer cortar seus próprios gastos e exagerados privilégios, o governo repassa o alto custo da sua corrupção e incompetência para a população pagar... e ainda afirma que não tem dinheiro!!

Vai ficar parado?!

Acorda Brasil!”

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Quando vier a Primavera

Alberto Caeiro

Quando vier a Primavera,

Se eu já estiver morto,
As flores florirão da mesma maneira
E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada.
A realidade não precisa de mim.

Sinto uma alegria enorme
Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma.

Se soubesse que amanhã morria
E a Primavera era depois de amanhã,
Morreria contente, porque ela era depois de amanhã.
Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
Por isso, se morrer agora, morro contente,
Porque tudo é real e tudo está certo.

Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.
Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.
O que for, quando for, é que será o que é.
(07/11/1915, Athena, nº 5, Fevereiro de 1925)

 

 

09.10.24

Poesia

Foureaux

poesia.jfif

A postagem hoje é resultado do famigerado “seleciona-copia-cola”. Muito prático, na maioria das vezes. Dois poemas. O primeiro não conhecia. Soube dele ao ver um filme de Bille August, O pacto (Pagten, no original), de 2021. Nele, um escritor declama este poema em dinamarquês. Procurei o tio google e ele me mandou a tradução do Manuel Bandeira. O segundo poema, já conhecido (e adorado!), é a mais castiça expressão do que sinto (pretensiosamente) sobre mim mesmo. Não tenho os quilates da poeta, mas sinto-me da mesma forma que ela diz se sentir em seu poema. Os tempos. obscuros e rasos, que nos compete viver têm efeito deletério sobre pequenos prazeres, revividos quando da leitura de poemas como estes dois...

 Anelo

Johann Wolfgang von Goethe

(Tradução de Manuel Bandeira)

 Só aos sábios o reveles,

Pois o vulgo zomba logo:
Quero louvar o vivente
Que aspira à morte no fogo.

Na noite - em que te geraram,
Em que geraste - sentiste,
Se calma a luz que alumiava,
Um desconforto bem triste.

Não sofres ficar nas trevas
Onde a sombra se condensa.
E te fascina o desejo
De comunhão mais intensa.

Não te detêm as distâncias,
Ó mariposa! e nas tardes,
Ávida de luz e chama,
Voas para a luz em que ardes.

Morre e transmuda-te: enquanto
Não cumpres esse destino,
És sobre a terra sombria
Qual sombrio peregrino.

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 Motivo

 

Cecília Meireles


Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.

 



 

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