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As delícias do ócio criativo

As delícias do ócio criativo

Filhos

Foureaux, 30.03.23

No penúltimo dia de março, bem longe de ser como “as águas de março, fechando o verão”, faço mais uma postagem. Depois de outro dos muitos “intervalos” na minha sequência de postagens. Elas já estão mais que devidamente justificadas, ainda que disso não precisem. Para nada! Então... Li o texto que segue na página de Facebook de uma amiga, ex-aluna, do Rio Grande do Sul, a Rosa Lilia Torres Delabary. Reproduzo ipsis litteris o dito cujo. Sem tirar nem por. E sem comentários, pois contundente é sua mensagem e irrecorrível, o meu acordo, apesar de não ser pai e, para além disso, ser muito grato por não sê-lo! Ah... is me esquecendo, o texto é irônico, viu! (É sempre bom esclarecer...!)

“Como criar um filho(a) inútil

Mário Corso (mariofcorso@gmail.com)

Para criar um filho inútil, você terá que ser muito útil. É preciso seguir corretamente alguns passos. Parece fácil, mas requer dedicação, ninguém nasce inútil, torna-se inútil.

Começaremos com o espírito que perpassa a empreitada. Existe uma tendência natural de os filhos acreditarem que seríamos mais ricos e poderosos do que somos. Se você conseguir manter essa ilusão, é meio caminho andado. Ele vai sentir-se como um futuro herdeiro.

Mantenha-o livre de tarefas dentro de casa. Ele não deve fazer nada. A magia das roupas faz parte do treino. Quando esparramadas pelo chão, devem aparecer limpas e arrumadas no armário. Tudo na casa é assunto dos pais ou dos empregados. A etiqueta à mesa está ultrapassada, ele pode sair da mesa para voltar ao videogame, ou ainda comer sozinho no quarto. Isso instala a magia da louça: agora suja sobre a mesa, aparecerá limpa e no mesmo lugar na refeição seguinte. Só devem ser familiares a ele a geladeira e a despensa de alimentos prontos. Vai que ele tente uma receita, pode descobrir que nada é fácil. Na escola, caso a direção o chame, fique ao lado dele. Se conseguir boas notas, não elogie o esforço, chame o de gênio. Instale uma visão pragmática, estudar só para a prova e o vestibular: isso garante que ele não se apaixonará pelo saber. Igual, o dinheiro pode lhe dar um diploma. Cuidado com os esportes. Se ele se apegar a uma prática e perseguir melhores performances, pode desenvolver a perseverança e a tolerância à frustração. A qualquer mínima queixa, troque de esporte. Isso vale para música. Eles seguem o exemplo, se você não ler nada, ele vai achar desnecessário. Se você só tiver olhos para o celular, ele fará o mesmo. Fique de olho na sociabilidade, ele pode descobrir que nem todo mundo é seu fã.

Dê tudo para seu filho, atenda a seus caprichos. Você finge ser rico, esteja à altura. É provável que seu filho atraia uma pessoa tão inútil como ele e a traga para morar em casa. Possivelmente, farão um filho sem pensar e você terá a alegria de um neto, ou mais, em casa. Sustentar todo este povo é um incentivo para seguir trabalhando. Adeus à vagabundagem da aposentadoria. Você se sentirá útil e produtivo até o fim dos seus dias. Você deve estar pensando: mas e depois que eu partir? Sossegue, você não estará aqui para ver. E, com todos esses gastos, conseguirá tornar seu filho um herdeiro, de dívidas.”

GZH

Leia outras colunas em gzh.com.br/mariocorso

 

Impressões

Foureaux, 20.03.23

Como descrever o que há por detrás das palavras e suas entonações durante um diálogo? Há que notar que neste caso particular, o diálogo se trava entre um príncipe e um primeiro-ministro, do mesmo país. Há uma dúvida no ar. O príncipe quer saber do primeiro-ministro o que ele pensa sobre o resultado da recente pesquisa sobre a monarquia. O primeiro-ministro diz que se trata de uma mera pesquisa, apenas. O príncipe rebate, argumentando que é perigoso não levar a pesquisa a sério. O primeiro-ministro encerra a discussão dizendo que igualmente perigoso é deixar-se guiar pela mesma pesquisa. A situação está, aqui, resumida, para efeito de análise e comentário. Na aparente simples troca de palavras que, por sua vez, dá expressão a uma aparente simples troca de impressões acerca de um evento banal, a pesquisa de opinião, existe um universo inusitado, imensurável e abissalmente complexo de possibilidades. Os movimentos labiais, as movimentações de sobrancelhas e os gestos manuais são contributos mais que decorativos na cena. Muito mais. Não se trata apenas de dramatizar uma situação concreta. No fundo, o que acontece é a transposição para a realidade de algo que a percepção humana não dá conta num primeiro momento. basta ver, a título de comparação, o que acontece quando, no início do filme, Gloria Swanson se dirige a William Holden, na sequência de abertura de Sunset Boulevard. Ela observa o rapaz distraído e pergunta quem é ele. Se identificam e se apresentam. Ele comenta que ela parecia ser “maior”, em tom irônico, pois ele reconhece a grande estrela do cinema mudo. Ela replica dizendo que ela é grande, as fotografias é que ficaram menores. O chiste, muito sutil e sofisticado, exala toda a malícia da observação, o que toca o nervo central da figura da atriz, por que não, decadente. Esta sequência, ainda no início do filme, dá o tom de todo o relato imagético. Com esses dois exemplos, o que está no fundo de minhas elucubrações aqui é o fato de que algo muito importante tem sido desperdiçado se já não está totalmente perdido, na sociedade “progressista” da/na atualidade: o valor da palavra. E ambos os exemplos, o senso comum depauperado dos dias que correm evidencia a sequência de imagens e se esquece de prestar atenção nas palavras. Houve um tempo em que o que era dito por alguém tinha um valor quase material, concreto, ontológico mesmo. Não era necessário comprovar nada com documentos, assinaturas, sinetes em lacrem, coisas do tipo... A palavra bastava. A opinião de alguém servia de guia para o que quer que fosse. Como acontece em Sociedade dos poetas mortos e o método utilizados pelo novo professor de Literatura que provoca revolução profunda na didática do ensino da escola “careta” em que passa a lecionar. Tanto é assim que ele transforma a vida de três ou quatro estudantes no filme. As palavras do professor foram suficientes para orientar os estudantes nos caminhos e descaminhos de suas descobertas adolescentes, confrontando-os com uma realidade avessa a este mesmo caminhar. Nos três exemplos aqui elencados, a palavra é soberana, sobrepõe-se à sequência imagética e define um campo subliminar de atenção/ percepção que, hoje em dia, costuma ser desprezado. Numa sociedade que endeusa a imagem e a aparência com o intuito de criar uma ilusão fantasiosa e invejável, a palavra tem sido subjugada e relegada a um plano inferior, aquele das injúrias, dos lugares comuns, do analfabetismo funcional que assola o mundo. Basta acompanhar por pouquíssimos minutos uma série de postagens, nas famigeradas redes sociais, para constatar este fato. Sobretudo nas postagens que se dizem oriundas de “influenciadores”. Nestes casos, é corriqueiro o uso de consoantes coladas, sem vogais para substituir as palavras; o uso de verbos no infinitivo, sem o erre que caracteriza este caso; a quase absoluta inexistência de concordância nominal, em nome de uma outra “linguagem” tida e havida como mais “inclusiva”. Ledo engano. O desprezo pela palavra está matando valores mais que basilares por inanição sufocante. Uma lástima. Não sei se me fiz entender, mas sei que disse o que me deu vontade. Punto i basta!

 

Do diário

Foureaux, 14.03.23

Na semana passada fiz uma enquete no meu blogue. Apenas três pessoas responderam. Coloquei dois poemas, sem identificação de autoria e perguntei qual dos dois agradava mais a quem lesse e por quê. As justificativas, por óbvio, vou manter em sigilo. as identidades de quem comentou também, mas a resposta dos três, como foi unânime, não escondo: o segundo poema, chamado “B” na postagem, foi o que agradou mais. Era um poema da Bruna Lombardi. O outro, “A” na postagem, era de minha autoria. Depois de ler e reler os comentários e de trocar ideias com, pelo menos, dois dos que leram e responderam, fiquei pensando num monte de coisas. Entre estas coisas, ocorreu-me pensar que minha poesia não agrada. Deixei este pensamento de lado depressinha. Não se pode deduzir tal coisa com apenas três opiniões, ainda que unânimes, num universo de três informantes. Para quem é escravo de estatística, isso quer dizer alguma coisa. Para mim, diz que a opinião alheia é subjetiva, como a minha, e não pode ser tomada como “valor absoluto” de nada, em relação a nada. Isso não é desrespeito à opinião alheia, pelo contrário. É mesmo um respeito enorme pois cada um sabe de si, cada tem um conjunto de informações/experiências/exemplos/práticas/ideias que ajudam a amoldar o back ground a partir do qual emitem sua opinião. Por isso mesmo o respeito. Esta ideia também deixei de lado. Fiquei com a suposição de que, em primeiro lugar, a poesia que escrevo tem que agradar a mim. Se agrada a outras pessoas, no frigir dos ovos, vai fazer pouca diferença, na concretude da situação. Poderei continuar gostando do poema que escrevi em que pese a desaprovação alheia, quando e se for o caso. O que não ocorreu na enquete. Pena foi que apenas três pessoas responderam. A ideia de que minha poesia não vale muito voltou a me rodear o pensamento. Dou tratos à bola e sigo escrevendo. Quem sabe um dia...

 

Na interrupção de minhas anotações, deixei de comentar o bizarro, por óbvio, que foi a audiência de conciliação com o banco do Brasil. Na véspera, estava eu apreensivo, com medo de me exaltar e botar tudo a perder. Em vão. Quando consultei a advogada sobre isso ela riu e disse exatamente o que aconteceria. E aconteceu. Abriu-se a sessão, a mediadora (uma menina) leu o caput da ação. Perguntou à representante do banco se havia proposta de acordo. Negativo. Perguntou à advogada que me representa se tinha algo a dizer. Negativo. Leu então o parágrafo protocolar sobre o tópico. Foi interrompida pela representante do banco que pediu o acréscimo de solicitação de meu testemunho oral. Tudo acertado. Assinamos o papel e saímos. Tudo isso não durou quinze minutos. A representante do banco, se minha memória não me trai, é a mulher que. me ajudou a encerrar a conta de papai, mesmo antes de abrir o inventário. Em dois dias estava tudo resolvido. Entrou com pose de importante, com arrogância. Falou baixíssimo, o que me deixou intrigado pois não consegui escutar mais que o cicio de sua vez. Na saída pedi à advogada a confirmação da necessidade de meu testemunho oral diante do juiz. Ela disse que depende do meritíssimo pois o teor desse testemunho já está escrito no corpo do processo, acompanhado das “provas”. No fundo, no fundo, não tenho muita esperança. Penso que o banco vai protelar, protelar e protelar até eu desistir. Só desisto quando não houver mais saída, mas penso que jamais verei o dinheiro roubado de volta.

 

Faz dias e dias que não escrevo nada. Nem prosa, nem verso. Tenho lido bastante. Li dois livros que foram motivo de curiosidade no passado: Viagem ao redor de meu quarto (Xavier de Maistre) e No coração das trevas (Joseph Conrad). Que decepção! Creio que o passar do tempo fez arrefecer a curiosidade ou então ela ficou insatisfeita com a leitura, devido às fantasias inconscientes que minha psique elaborou e não me revelou. Não vi graça nenhuma em nenhum dos dois livros. Li tanto sobre eles. Escutei tantos elogios. Até vi um filme baseado num deles (Apocalipse Now – Francis Ford Coppola). Estou pra dizer, que, mesmo não fazendo meu “gênero” predileto de filme, este me agradou muito mais que o livro. Que coisa sem graça. O mesmo eu digo do texto do escritor francês. Pensei que se tratava de algo criativo, instigante e curioso. Nada. Um amontoado de anotações inusitadas e, porá ser sincero, com muito pouco sentido. Não gostei. Pronto. Isso não determina o destino das duas obras, Também não define sua posição num ranking de agrado ou sucesso. Quem sou eu para tanto... Só não vou ficar papagueando salamaleques pra ser politicamente correto. Não gostei. Punto i basta!

Enquete

Foureaux, 06.03.23

Resolvi fazer uma provocação. Uma espécie de pulo no escuro para os que me leem. Abaixo seguem dois poemas “A” e “B”. Não vou dizer quem são os autores. São apenas três perguntinhas:

Qual dos dois mais agrada você?

O que, num, é mais bonito que noutro?

Qual dos dois é o “melhor”?

Adoraria ver as respostas chegando, mas...

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“A”

Já não verei a parede manchada

pelas contínuas investidas da chuva

(torrencial ou não),

e o cartaz vermelho com os preços

do combustível que alimenta os carros

a soltar fumaça

espalhar fulgem

ajudar a manchar as paredes

acompanhando a chuva

(torrencial ou não).

 

Já não verei a velhinha atravessa a rua

devagar

sobraçando sacola de mercado, 

com o necessário para o dia 

(que a carestia é muita!).

Nem verei o menino que vende balas para levar comida pra casa

(o atraso da revolução é grande).

 

Já não verei a menina que cora com o olhar desejoso do frentista,

nem a careta da beata depois da missa das seis.

 

Já não verei quase nada.

 

Tudo vai ser apenas memória.

Será?

E esse dia está para chegar.

 

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“B”

eu gosto dos venenos mais lentos
dos cafés mais amargos
das bebidas mais fortes
e tenho
apetites vorazes
uns rapazes
que vejo passar
eu sonho
os delírios mais soltos
e os gestos mais loucos
que há
e sinto
uns desejos vulgares
navegar por uns mares
de lá
você pode me empurrar pro precipício
não me importo com isso
eu adoro voar.

Livro

Foureaux, 05.03.23

Penso em escrever um livro de memórias de uma outra pessoa. Uma personagem, obviamente, inventada. Seu nome, até que eu mude de ideia é Temístocles Praggi. Tem uma história peculiar e deixou de herança, para um amigo muito próximo, a missão de publicar suas memórias com alguns cuidados. Não vou revelar-los aqui e agora, claro! Mas ando pensando muito nisso. vai ser um livrão. Vai aparecer, em algum momento do livro, uma mensagem que recebi de uma editora, dando explicações do porquê não aceitaram meu livro para publicar e acrescentando "dicas" do que fazer para queque livro seja aceito por qualquer editora e tenha sucesso. Na hora que li a mensagem, fiquei dividido entre a raiva mais incontrolável e o acesso de riso que acabou por vencer. Quase engasguei de rir com a capacidade de intromissão e a empáfia de determinar oq ue vai ser necessário para o sucesso do meu livro. Quanta pretensão. Se eu escrever mesmo o livro, quem o ler vai saber do que estou falando. O trecho que segue faz parte dele.

"Não escrevi nada desde o carnaval. Fico pensando nos “conselhos” que o povo de oficina de escrita criativa e os famigerados “editores” – principalmente das editoras pequenas, aquelas que trabalham em “colaboração” – quando dizem que o “bom escritor” tem que escrever todos os dias, que a rotina e o método são essenciais para o sucesso da obra, e coisas equivalentes. Mas o que é mesmo um “bom escritor”? Sempre que penso nisso, me vem à mente um artigo do Antonio Candido intitulado “No raiar de Clarice Lispector”. Se não me equivoco, foi o primeiro artigo escrito sobre a obra da então “nascente” escritora. Até então uma ilustre desconhecida no “mundo das letras”, apesar de trabalhar como jornalista que era. Logo no começo de seu ártico, Antonio Candido afirma: “Por isso tive verdadeiro choque ao ler o romance diferente que é Perto do coração selvagem, de Clarice Lispector, escritora até aqui completamente desconhecida para mim. Com efeito este romance é uma tentativa impressionante para levar a nossa língua canhestra a domínios pouco explorados forçando-a adaptar-se a um pensamento cheio de mistério: para o qual sentimos que a ficção não é um exercício ou uma aventura afetiva, mas um instrumento real do espírito, capaz de nos fazer penetrar em alguns dos labirintos mais retorcidos da mente.” Como não estou escrevendo um trabalho acadêmico, mando às favas as famigeradas normas. Note-se que o autor afirma que a escritora é desconhecida “para ele”. Isso quer dizer que ele pode não ter sido o primeiro a ler a obra de Clarice Lispector em questão.  Outra coisa é ao fato de ele considerar “canhestra” a Língua Portuguesa. O que será que ele quis dizer com isso? O que ele afirma sobre ficção acaba por ser suplantado pela opinião de que a escrita de Clarice Lispector é, na leitura que dela faz Antonio Candido, caminho para penetrar ‘em alguns dos labirintos mais retorcidos da mente”. Essa é a opinião dele. Até prova em contrário, primeiro “julgamento” crítico da obra então nascente de Clarice Lispector. O que eu quero com isso? Nada mais que sublinhar o fato de que se, salvo engano, Antonio Candido foi mesmo o primeiro a explanar sua opinião sobre o romance de Clarice Lispector – no artigo ele faz comparações de cunhos analítico com outros escritores brasileiros, argumentando com ideias acerca de ficção, de série histórica e de “efeito de obra” – tudo o que ele disse pode ser tomado como expressão de uma verdade até então desconhecida. Ou não? Ora, se assim for, chega-se à conclusão de que é possível que seja outra a “verdade” expressa pela obra da escritora. Basta considerar que outras pessoas podem ter lido o mesmo livro que Antonio Candido e que, por conta disso, tiveram outra “impressão” do livro, formaram sobre ele outra opinião. Viu como é fácil desfazer o mito de que a crítica é infalível, ou por outra, como a posição de um crítico é apenas mais uma, sobretudo se outros leitores não tiveram a mesma opinião daquele que primeiro escreveu sobre determinada obra? O critério da “objetividade” se autodestrói e deixa aberta uma ferida que, até hoje, nenhum “teórico” foi capaz de deslindar. Tomara que não venha a existir tal “teórico”, dado que se vier a existir, toda a Literatura, como fenômeno cultural que é, deixará de ter sentido, poderá, mesmo, deixar de existir... Mas isso é apenas a minha opinião."

Brasilidade(s)

Foureaux, 28.02.23

Lugar comum: o Brasil é um país de dimensões continentais. Outro lugar comum: a di-versidade cultural do Brasil é riquíssima. Esta, por sua vez, pode ser percebida através da linguagem regional que, utilizando a mesma Língua Pátria, o Português, ainda que falado de maneira um tanto peculiar em relação às de mais regiões falantes da mesma língua mundo afora, é um rico manancial de exemplos da referida diversidade. Senão, vejamos:

No Acre: “Arre diacho” é expressão de espanto, “Arrodear” é dar a volta; “Espocar”, estou-rar); “Xiringar” é espalhar, “Cutex” é esmalte, “Extrato” é perfume, “Ruma” é amontoado e “Baldear” é jogar água do balde.

Em Alagoas: “Eita gota” é uma expressão de espanto, “Lomba” significa engraçado, “Pei-dado” é revoltado, “Azogado” é ansioso, “Avalie” significa veja só, “Cacete” é surra, “Caba de pêia” é safado e “Biboca é um lugar distante.

No Amazonas: Telezé é a abreviação “Tu é leso, é?”, pessoa sem juízo; “Pegar o beco” é ir embora, “Te arreda” significa afastar, “De rocha” é o mesmo que de verdade, “Égua” não é a fêmea do cavalo mas uma expressão de espanto e admiração, “Dana de rato” é enrola-ção, “Ê Caroço” significa salvo por pouco e “No olho” significa resposta certeira.

Já na Bahia: “Ôxe ou oxente” é interjeição equivalente a “Ô”, “Comer água” é o mesmo que beber, “Se pique” é como dizer “saia daqui”, “Crocodilagem” é o ato de enganar, “Barril dobrado” significa tenso; “Casa da porra”, longe; “Migué” é mentira, “Ó Paí” equi-vale a olha isso, “Parta a mil” é como dizer para sair rápido, “Ficar de cocó” é segredo e “Dar um zig é enganar.

No Ceará: “Arre Égua” se usda para exprimir espanto, “Acunhar” é chegar junto, “Baixa da égua”é um lugar distante, “Bregueço” significa antiquado, “Canelau equivale a ignoran-te, “Ceroto” é sujeira, “Magote” é uma aglomeração de pessoas, “Chei dos pau” é o mes-mo que bêbado e “Gastura” é azia.

No Distrito Federal: “Véi” é alguém, “Pagar vexa” equivale a passar vergonha, “Pala” é algo ruim, “Lombra” significa devaneio, “Esparrado” ‘e o mesmo que ótimo, “Bau” é ônibus, “Cabuloso” significa exagerado e “Morgando” é o que se diz quando se está sem fazer na-da).

No Espírito Santo: “Massa” é algo legal, “Chapoca” é usado para identificar algo maior que o normal, “Véi” é como se chama alguém, “Cacunda” equivale a “nos ombros”, “Palha” é alguma coisa ruim, chata, “Champinha” é tampinha, “Pão de sal” é o famoso pão francês e “Pocar” equivale a estourar, no sentido de “muito bom”.

Em Goiás: “Rensga” é expressão de espanto, “Carcá” equivale a colocar, “Bão demais da conta” é algo ótimo, “Anêim” é expressão que significa “Ah, não...”, “Paia” é um sujeito chato, “Mocorongo” é bobo, “Ridico” é o sujeito egoísta, “Tem base?” equivale a “pode ser?” e “Trupicar” é o mesmo que tropeça).

No Maranhão: “Éguas” é o que se diz quando a gente se espanta, “Esparroso” é o mesmo que exagerado, “Aziado” equivale a sem ânimo, “Só quer ser” é expressão que identifica uma pessoa metida, “Dá teus pulos” é o mesmo que “Se vira”, “Invocado” é um sujeito zangado, “Remoso” é o mesmo que perigoso, “Té doido” é igual a “tá doido” e “Perainda” significa o mesmo que “Espera!".

No Mato Grosso: “Agora quando?” expressa dúvida, “Atarracado” é o mesmo que abraça-do, “Bocó de fivela” é um sujeito ignorante, “Arroz-de-festa” é aquele que não perde festa, “Corre duro” é o mesmo que “anda rápido!”, “Cêpo” é sinônimo de ótimo, “Catcho” é namoro, “Leva-e-traz” é o sujeito fofoqueiro e “Moage” significa frescur).

No Mato Grosso do Sul: “Alas” é legal, “Pior” se usa quando se concorda com algo/ al-guém, “Manjar” equivale a entender, “Jow” é amigo, “Barca” é sinônimo de carro, “Ba-guiu” é coisa, “Morgar” significa ter preguiça, “Dar um pião” significa sair e “Goma ou Gruta” é o mesmo que cas).

Em Minas Gerais: “Uai” é a famosa e peculiar interjeição com vários sentidos, “Sô” é forma corriqueira de senhor, “Arredar” significa mexer, “Trem” é o mesmo que coisa, “Cata-jeca” é o ônibus do/no interior do Estado, “Fragar” significa entender, “Zé dend’água” é o sujeito bobo, “Bololô” é o mesmo que confusão, “Bicudo” equivale a (bêbado) e “Pica a mula” é o esmo que cai fora.

No Pará: “Égua” é uma interjeição para exprimir espanto, “De rocha” é algo/alguém sé-rio, “Não, é pão” equivale a claro que sim, “Nem com nojo” é o mesmo que de jeito ne-nhum, “Bazuca” é chiclete, “Carapanã” é um mosquito, “Rapidola” é sinônimo de rápidoe “Filho de pipira” é alguém que sempre pede coisas.

Na Paraíba: “Oxente” é interjeição que exprime admiração, “Abibolado” se usa para al-guém sem juízo, “Arribar” significa sair, “Encarcar” é fazer pressão, “Miolo de pote” é uma coisa sem importância, “Chapéu de touro” é alguém que se relaciona com pessoa infiel e “Avoar” é o mesmo que jogar fora.

No Paraná: “Piá” é como se chama o menino, “Pila” é moeda, “Posar” é dormir na casa de alguém, “Cozido” significa bêbado, “Penal” e um estojo para lápis, “Apurado” é quem está com pressa, “Ligeirinho” é como se chama o ônibus por lá, “Pani” é padaria e “Piá de prédio” é um menino ingênuo.

Em Pernambuco: “Visse” tem o mesmo sigbnificado que a interjeiçõ “certo”, “Buliçoso” é alguém que mexe em tudo, “Emburacar” significa entrar em licença, “Boysinha” é a ma-nera carinhosa de se chamar a namorada, “Pantim” é uma dificuldade, “De rosca” signifi-ca difícil, “Arretado” é um sujeito bravo, “Zuada” é como se idêntica um barulho, “Taba-cudo” é um sujeito bobo e “Queijudo” é uma pessoa cheia de frescura.

No Piauí: “Pense” ou “Abestado” é um otário, “Botar catinga” significa atrapalhar, “Bude-jar” é o mesmo que falar muito, “Mangar” é rir de alguém, “Triscar” significa encostar, “Espancar a lôra” é um convite para beber cerveja, “Moiado” é feio e “Caxaprego” é um lugar distante.

No Rio de Janeiro: “Já é” expressa concordância, “Meter o pé” é o mesmo que sair, “Va-leu” tem o mesmo valor de um agradecimento, “Mermão” é igual a meu irmão, “Bolado” significa chateado, “Caô” é uma mentira, “Parada” significa qualquer coisa, “Tá ligado?” tem o mesmo sentido de “presta atenção”, “Maneiro” é sinônimo de legal e “Trocar uma ideia” significa conversar.

No Rio Grande do Norte: “Eita píula” é uma interjeição de surpresa, “Galado” é o mesmo que engraçado, “Balaio de gato” é sinônimo de bagunça, “Bagana”, a ponta de cigarro, “Bexiga taboca” é alguém com muita raiva e “Gangueiro” significa de gangue ou com cal-ças largas.

No Rio Grande do Sul: “Bah” é interjeição que expressa admiração, “Tchê” é uma sauda-ção, “Arrecém” equivale a há pouco, “Atucanado” é um sujeito preocupado, “Bucha” é si-nônimo de difícil, “Guri/guria é o mesmo que menino/menina, “Peleia” é uma boa briga, “Talagaço” significa “de uma vez só e “Trova” é o mesmo que mentira.

Em Roraima: “Tédoidé” é uma expressão de admiração, “Curumim” significa menino, “Maceta” é o mesmo que grande, forte, “Brocado” é alguém que está com fome, “Piseiro” é um lugar com festa ao ar livre, “Cotião” é um homem solteiro”, “Bota pra cima” tem o mesmo significado que “desafia” e “Bisonho” é aquele sujeito sem noçã).

Em Rondônia: “Marrapaz” é uma expressão que denota surpresa, admiração, “Meu ovo” expressa discordância, “Leseira” é o mesmo que preguiça, desatenção, “Lazarento” é um sujeito infeliz, “H”, o nome da letra, quando falado significa papo furado, “Cair na bura-queira” é o mesmo que cair na gandaia e “Casão” é como é conhecido o presídio.

Em Santa Catarina: “Tash tolo?” é o mesmo que Tá louco?, “Manezinho” é o morador da Ilha de Florianópolis, “Lagartear” significa passear, “Jererê” é a rede de pesca, “Calhau” é uma coisa grande, “Botar tento” significa prestar atenção, “Matar a pau” é acertar em cheio, “Em 2 toques” é aquilo que é/vai ser rápido e “Ajojado” é um sujeito quieto.

Em São Paulo: “Mano ou Meu” é o modo corriqueiro de chamar um homem ou uma mu-lher, “Bang” é coisa, “Camelar” é o mesmo que andar a pé, “Dar um pião” é a mesma coisa que dar uma volta, “Da Hora” significa legal, “Dois Palitos” tem o mesmo significado que rápido, “Na faixa” é alguma coisa “de graça”, “Rolê” é uma festa, “Bater uma laras” signifi-ca comer, “Bugado” é a;guém que está perdido, sem entender e “B.O.” é o mesmo que problema.

Em Sergipe: “Vôti” é uma interjeição que expressa surpresa, “Pungar” é entrar em veículo em movimento”, “Pentcha” é uma expressão de admiração, “A migué” é ficar à toa, ao acaso, “Quem gaba o sapo é jia” é uma espécie de elogio a alguém próximo e “Fumbam-bento” significa desbotado.

Entrevista

Foureaux, 16.02.23

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Uma pequena entrevista que não agrada a muita gente. Como também não agradam à mesma gente os livros que este homem escreve. No entanto, não posso deixar de dizer que o admiro pela competência, pela clareza, pelo conhecimento  e pela assertividade que demonstra. Um homem inteligente que atinge o ponto fraco, sem o intuito de ferir por ferir. Denuncia o equívoco, demonstra sua organicidade e aponta as maneiras possíveis de encontrar a resposta mais adequada – jamais a “certa”, nem a “definitiva”, como aqueles que se com ele se incomodam.

Até setembro de 2016, o canadense Jordan Peterson era um pacato professor de psicologia clínica na Universidade de Toronto, que mantinha um canal no YouTube popular entre os alunos e tinha escrito um ... livro pouco conhecido sobre a relação entre psicologia, política e religião. A aprovação da Lei C-16, no Canadá, que tornou crime a discriminação contra transexuais, travestis e “pessoas não binárias”... (as que não se identificam nem como homem, nem como mulher), acabou com a calmaria e fez de Peterson uma espécie de popstar. Enfurecido com o fato de poder ser processado se deixasse de usar os chama... pronomes neutros – ze em vez de he ou she, equivalente ao “elx”, popularizado na internet, para ele ou ela em português —, Peterson pôs a boca no trombone contra o que via como excessos da lei. Um debate sobre o tema na TV inglesa com sua participação foi visto mais de 13 milhões de vezes no YouTube. Alçado a porta-voz do politicamente incorreto, viu seu segundo livro, 12 Regras Para a Vida: Um Antídoto Para o Caos (Editora Alta Books) em oito meses virar bestseller, com mais de 2 milhões de cópias vendidas no mundo (e quase 75.000 exemplares no Brasil). De Oslo, escala da turnê de divulgação do livro, Peterson falou a VEJA por telefone.

 

O senhor ganhou projeção internacional ao se opor à lei que regulamenta o uso de pronomes neutros para transgêneros. Qual é o problema com a lei?

A maioria dos que a apoiam afirmam que, na construção da identidade humana, o sexo biológico, a expressão do gênero e as preferências sexuais de uma pessoa podem variar de modo completamente independente, pois são meras construções sociais. Isso não é verdade. Estes fatores não apenas não variam de forma independente, como estão intimamente relacionados. É claro que, em algum grau, são construções sociais, mas menos do que os ativistas alardeiam. Não gostei de ver aprovada uma lei baseada em uma premissa tecnicamente falsa só para cumprir uma agenda ideológica, sem reflexão a respeito e sem consideração pelas consequências – a começar pela restrição da liberdade de expressão.

A lei não é uma forma de garantir os direitos dos transgêneros?

Garantir estes direitos não tem nada a ver com a forma como são chamados. Esta é uma escolha voluntaria. Eu não tenho nada contra usar com meus alunos o pronome que eles preferirem. Mas o governo decidir como a pessoa vai se expressar só para agradar uma parcela da sociedade é errado. Não se pode colocar limites na forma de expressão. Recebo muitas cartas de pessoas transexuais que apoiam meu trabalho, se incomodam com o papel de símbolo de uma campanha da esquerda ultrarradical pela dissolução das identidades clássicas e querem mesmo é tocar sua vida privada da melhor forma possível.

Não seria saudável e até justo proteger a população LGBT de discursos nocivos? 

De jeito nenhum. É precisamente o oposto. A conduta correta para lidar com a vulnerabilidade é identificar a razão, criar uma hierarquia de medos e aprender a confrontá-los e dominá-los. Proteger é uma abordagem errada. A história da psicologia clínica nos últimos 150 anos comprova que a exposição voluntária da pessoa ao que a ameaça ou incomoda é o caminho certo para ganhar coragem e superar problemas. A ideia de que proteger as pessoas é agasalhá-las em seus micro espaços, para que nunca ouçam uma opinião que as ofenda ou contradiga, só faz com que elas se tornem mais fracas e amargas.

O senhor já declarou que a capacidade de pensar embute o risco de ser ofensivo. É impossível debater sem ofender?

É claro que você deve procurar ser sempre o mais gentil possível. A questão é que só precisamos pensar de verdade quando aparece um problema de solução importante, até de vida ou morte. Se a solução é tão importante, haverá várias formas de discuti-la, nem sempre compatíveis entre si – e aí começa o debate conflituoso. Os pontos de vista sempre vão colidir quando o que está em jogo é tentar mudar a maneira de a outra pessoa ver o mundo. É impossível ter esta discussão sem conflito, mesmo procurando ser o mais gentil possível.

Fonte: Jordan Peterson: A liberdade de expressão é perigosa; a alternativa é pior | VEJA (abril.com.br)

Repetição

Foureaux, 15.02.23

Minha postagem de hoje, apesar da canícula indecorosa da tarde e início da noite, faz uso de um famigerado princípio ativo na composição das igualmente famigeradas “narrativas”: o princípio da repetição. O texto não é meu (como vai registrado no fim dele). Gostei e repito, pois tenho a impressão de que já escrevi sobre o assunto umas duas vezes por aqui. Não importa. Como o princípio da repetição é que me move hoje, lá vai...

“Professora de Português dando aula. E que aula!!!*

‘Vamos conversar.

Não sou homofóbica, transfóbica, gordofóbica.

Eu sou professora de português.

Eu estava explicando um conceito de português e fui chamada de desrespeitosa por isso.

Eu estava explicando por que não faz diferença nenhuma mudar a vogal temática de substantivos e adjetivos pra ser ‘neutre’.

Em português, a vogal temática na maioria das vezes não define gênero. Gênero é definido pelo artigo que acompanha a palavra.

Vou mostrar para vocês:

O motorista. Termina em A e não é feminino.

O poeta. Termina em A e não é feminino.

A ação, depressão, impressão, ficção. Todas as palavras que terminam em ação são femininas, embora terminem com O.

Boa parte dos adjetivos da língua portuguesa podem ser tanto masculinos quanto femininos, independentemente da letra final: feliz, triste, alerta, inteligente, emocionante, livre, doente, especial, agradável etc.

Terminar uma palavra com E não faz com que ela seja neutra.

A alface. Termina em E e é feminino.

O elefante. Termina em E e é masculino.

Como o gênero em português é determinado muito mais pelos artigos do que pelas vogais temáticas, se vocês querem uma língua neutra, precisam criar um artigo neutro, não encher um texto de X, @ e E.

E mesmo que fosse o caso, o português não aceita gênero neutro. Vocês teriam que mudar um idioma inteiro para combater o ‘preconceito’.

Meu conselho é: em vez de insistir tanto na questão do gênero, entendam de uma vez por todas que gênero não existe, é uma coisa socialmente construída.

O que existe é sexo.

Entendam, em segundo lugar, que gênero linguístico, gênero literário, gênero musical, são coisas totalmente diferentes de ‘gênero’.

Não faz absolutamente diferença nenhuma mudar gêneros de palavras.

Isso não torna o mundo mais acolhedor.

E entendam em terceiro lugar, que vocês podiam tirar o dedo da tela e pararem de falar bobagem e se engajarem em algo que realmente fizesse a diferença para melhorar o mundo, ao invés de ficarem arrumando discussões sem sentido.

Tenham atitude! (Palavra que termina em E e é feminina).

E parem de ficar militando no sofá! (palavra que termina em A e é masculina).

Quando me questionam por que sou de direita, esta é a explicação:

Quando um tipo de direita não gosta de armas, não as compra.

Quando um tipo de esquerda não gosta de armas, quer proibi-las.

Quando um tipo de direita é vegetariano, não come carne.

Quando um tipo de esquerda é vegetariano, quer fazer campanha contra os produtos à base de proteínas animais.

Quando um tipo de direita é homossexual, vive tranquilamente a sua vida.

Quando um tipo de esquerda é homossexual, faz um auê e inventa que está sofrendo de homofobia.

Quando um tipo de direita é ateu, não vai à igreja, nem à sinagoga, nem à mesquita.

Quando um tipo de esquerda é ateu, quer que nenhuma alusão a Deus ou a uma religião seja feita na esfera pública.

Quando a economia vai mal, o tipo de direita diz que é necessário arregaçar as mangas e trabalhar mais.

Quando a economia vai mal, o tipo de esquerda diz que os ‘malvadões’ dos patrões são os responsáveis e param o país.

Tese final:

Quando um tipo de direita lê este texto, ele ri, concorda que infelizmente é uma realidade e até compartilha.

Quando um tipo de esquerda lê este texto, te insulta e te rotula de fascista, nazista, genocida, etc. .’

Aula encerrada.

________

*domínio público”

 

 

Desvios

Foureaux, 12.02.23

Uma fábula fabulosa!

Adoro fábulas, desde a infância. Antes de me aposentar, escrevi uma fábula (na verdade, uma parábola) sobre a situação que àquela altura se desenhava no Instituto, por conta de uma pretendida reforma curricular. Não foi o sucesso que imaginei, mas acertei no alvo. Sei disso por conta do único comentário que recebi de um colega se abismou com a minha “coragem”. O resto é história... A fábula que segue não e de minha autoria. Gostei, por isso, compartilho.

 

SÓCRATES ENCONTRA PROFESSOR DA USP

“Sócrates, enviado para 2017 em um vórtice temporal, cai em São Paulo, no meio de um manifesto, e encontra um militante esquerdista:

– Olá, excelente rapaz! Do que se trata toda essa gente reunida?

– Olha, velhote desinformado, estamos lutando contra a elite por justiça!

– Sim, eu realmente sou um desinformado, eu sou quem não sabe, mas estou muito feliz de encontrar você, que realmente sabe! Peço que me ensine, é possível?

– Sim, claro, sou da USP, tem muita coisa que você precisa aprender!

– É um grande dia, excelente rapaz! Finalmente encontrei alguém sábio que me ensinará! Primeiro, gostaria de saber o que é a elite, depois o que é justiça e por último por qual aplicação de justiça estão lutando. Pode ser nessa ordem?

– Sim, isso é fácil!

– Perfeito! O que é a elite!?

– A elite são os ricos, que têm muito dinheiro, muitos bens.

– Então, o critério para discernir a elite é a quantidade de dinheiro, de bens, que possui, certo?

– Sim, é esse mesmo!

– E a partir de que ponto um homem é considerado rico, participante da elite?

– A classificação disso é através classes sociais, que são A, B, C, D, E e F! A classe A é quem tem mais, e vai diminuindo para quem tem menos, até a classe F, que é praticamente miserável e não tem nada...é por eles que lutamos!

– Certo, como eu posso identificar quem é a elite nesses termos?

– São as classes A, B e C, mas é só ver quem ganha mais de 2.300 por mês, que já é elite!

– Entendi, e os outros todos não são elite, certo?

– Sim, o critério é esse.

– Quem ganha mais de 2.300 por mês é a elite, e a elite é malvada, certo?

– Certo!

– E quem ganha menos de 2.300 por mês não é da elite, e não é malvado, correto também?

– Sim, é exatamente isso! O senhor está aprendendo muito bem! Qual seu nome?

– Meu nome é Sócrates, excelente rapaz!

– Certo, Sócrates! Está aprendendo muito bem.

– Você é formado em uma universidade, não é isso?

– Sim! Sou inclusive professor! Da USP, como eu disse!

– Que dia maravilhoso para mim, excelente rapaz! Encontrei finalmente um sábio! Quanto ganha um professor da USP?

– Eu ganho 10 mil…

– Então...você é da elite e é malvado?

– Não… é que… olha… eu luto pelo povo e… eu quero só o bem dele!

– Mas você disse que o critério era esse…

– Eu sei, parece estranho, mas são nossos representantes que vão acabar com essas diferenças sociais!

– Estou me esforçando para compreender: quem são seus representantes?

– São os políticos!

– Quanto ganha um político hoje, rapaz?

– Depende: deputado ganha cerca de 39 mil por mês, um senador uns 33 mil…

– Então eles são da elite também!

– São, sim… mas são eles que vão fazer o bem para o povo!

– Mas você me disse que a elite só faz o mal, e que o critério é que quem ganha mais de 2.300 por mês é mau...tanto você quanto seus representantes são da elite, devo supor que são maus, segundo suas próprias palavras… ou será de outra forma?

– Estou desconfiando que você é um infiltrado, velho! Como pode duvidar do que estou dizendo?

– Eu estou tentando aprender, você disse que me ensinaria. Mas, afinal, você é um homem mau e seus representantes também são maus, ou esse critério estará errado?

– Eu não sou mau! Lula é santo! Que espécie de perguntas são essas?

– Chama-se lógica, rapaz, eu só estou examinando seu próprio critério… se o critério estiver certo, você e seus representantes são maus, se forem bons então o critério está errado… não será dessa forma?

– Está bem, talvez o critério esteja errado, pois eu sou um homem bom, e meus representantes também são bons, afinal estou lutando pela justiça, pelo bem, por algo bom!

– Muito bem, rapaz! E qual a luta de vocês?

– Lutamos contra os maus… quer dizer, a elite…

– Nos critérios que você me colocou?!

– Sim!

– Oras, estão lutando contra si mesmos?!

– Não! Bem, talvez o critério esteja errado mesmo…não sei mais!

– Mas, me diga, o que é justiça?

– Justiça é que todos ganhem o mesmo salário! Para não haver desigualdade, sabe?

– Mesmo os que não trabalham?

– Não, só os que trabalham, claro…

– Então já não são todos... Concorda?

– Bem, quis dizer todos que trabalham; os que não trabalham ganham bolsas, essas bolsas é para que não fiquem sem nada…

– Essas bolsas são como um salário?

– Sim! Recebem uma vez por mês!

– E de onde sai o dinheiro dessas bolsas, rapaz?

– Impostos! As pessoas trabalham e pagam impostos, o estado redistribui a renda, e paga as bolsas.

– Então quem paga as bolsas é quem trabalha, e é justo que quem não trabalha receba salário por não trabalhar, e quem está trabalhando pague salário a quem não trabalha?

– Sócrates, você está me deixando confuso…

– Apenas me responda, a justiça consiste em pagar salário para quem não trabalha, é isso?

– Não… é redistribuir a renda…

– Mas, no final da sua redistribuição, isso é o que acontece, ou não?

– Sim, é… mas…tudo parece estranho, eu sei. Mas, quando fizermos o comunismo, tudo vai ser diferente, tudo vai ser justo e ninguém vai ser miserável, não vai dar pra você entender agora… a elite é poderosa e controla tudo!

– Rapaz, até agora tudo que você me disse foi contraditório, não?

– Sim, foi! É que você precisa esperar o comunismo acontecer! Aí, sim, tudo vai fazer sentido!

– Oras, rapaz, então esse tal comunismo, deve ser maravilhoso...onde aconteceu?

– Cuba, Coreia do Norte, Russia, Alemanha Oriental…

– Então esses lugares devem ser o paraíso! Conte-me como são!

– Olha, as coisas não vão tão bem, alguns lugares já abandonaram o comunismo, mas os outros permanecem em luta!

– Rapaz, que surpresa! Por que afinal abandonaram algo tão maravilhoso?

– Não deu certo, mas continuamos tentando! É culpa do capitalismo!

– E os outros lugares?

– Cuba e Coreia do Norte continuam comunistas!

– Que maravilha! E como são esses lugares?! Estão bem? Todos são prósperos? Não existem mais classes?

– Pra falar a verdade, não estão bem não. Cuba e Coreia do Norte estão passando fome, mas isso é por culpa do capitalismo!

– Oras, mas um modelo tão bom, pelo qual vocês lutam, não faria apenas bem?

– É que os dirigentes não fizeram o comunismo como pensávamos, eles deturparam, fizeram outra coisa…

– Mas você me disse há pouco que eles eram bons…

– Eu disse mas… bem, nunca se sabe!

– Será que talvez vocês não estejam errados?

– Talvez, Sócrates…

– E por que esses países têm dirigentes?

– Eles têm poder militar, e muito capital…

– Oras, você me disse que não haveria classes sociais…

– No comunismo existem apenas as classes política e do proletariado!

– Então existem ainda classes, correto?

– Não tenho como discordar agora…

– Meu rapaz, não me parece que você esteja lutando por algo bom, pois seus exemplos foram todos maus, e não me parecem confiáveis seus representantes como bons, pois sempre terminam por trair o povo, e mesmo seus critérios não me parecem bons, pois não se sustentam agora, nem nos exemplos que me forneceu.

– O senhor está me deixando sem resposta. Eu preciso estudar mais…

– Eu agradeço a conversa, mas vou continuar procurando alguém realmente sábio, que possa me ensinar algo de sua sabedoria.

Um grupo de garotos se aproxima e cumprimenta o professor.

– Quem é este homem, professor?

– Um velho chamado Sócrates, que eu estava ensinando, mas agora estou um pouco confuso…

– Por que está confuso professor?

– Ele discordou de algumas ideias minhas, e eu não consegui sustentá-las…

O grupo de garotos grita:

– ATENÇÃO, TODO MUNDO! ESSE É UM VELHO FASCISTA! RACISTA! MISÓGINO! SEXISTA! HOMOFÓBICO!

Após levar cuspidas e apanhar, Sócrates sai ferido e desaparece no vórtice temporal.

O professor da USP prossegue em sua luta, mas cada vez que vê um velho calvo de barba comprida, começa a tremer de medo”.

(texto de Ricardo Roveran)

Dona Cleonice

Foureaux, 04.02.23

Meu primeiro contato com Cleonice Berardinelli, a dona Cleo – se é que isso interessa a mais alguém além de mim mesmo! – foi através de alguns de seus textos. Obviamente, aprendi muito com ela. Ouvia falar dela, muito. A primeira vez que a vi em carne e osso foi durante um congresso da ABRAPLIP – Associação Brasileira de Professores de Literatura Portuguesa. ainda não era associado. Fui a Niterói para apresentar uma comunicação. Ainda estava naquela fase de juntar papel para engrossar currículo, enquanto o doutoramento não era concluído. Quem abraça a “carreira” do magistério e se aventura pela “pós-graduação” sabe exatamente do que se trata. Pois ela estava lá, fazendo piada com o fato de que a soma dos anos de vida, mais os anos de docência somavam quase dois séculos. Risada geral. Quando a gente é parte da “academia”, a gente ri de cada coisa... Pois bem. Depois, foi em Belo Horizonte, durante um congresso da ABRALIC – Associação Brasileira de Literatura Comparada – nessa altura, eu já era membro. Comecei a acreditar que poderia afazer parte desse grupo de investigadores em iguais condições com os já associados. Ledo engano. Agora que começo a recordar estas passagens, já não me sinto seguro quanto à efetiva sequência cronológica desses episódios. Isso não importa. Não estou escrevendo nenhum documento “acadêmico”! Daí, quando colaborei com a criação de uma revista eletrônica de estudos literários luso-brasileiros, uma das primeiras em solo nacional, fui ao Rio de Janeiro, contando com intermediação de Gilda Santos – a fiel escudeira de dona Cleo – para uma entrevista. O número zero da revista queria homenagear a decana dos estudos portugueses no Brasil. Foi uma tarde mais que agradável, mais que divertida. Que mulher delicada! Que inteligência! Que clareza de raciocínio! Que potência de informação. Com seu tique nervoso característico, ria, falava, pensava e seduzia com olhar, com a palavra. Uma tarde memorável. Ainda houve um ou dois encontros casuais, sem muita intimidade – ela era sempre muito assediada por onde passava. O ponto alto de minha, digamos, relação com dona Cleo, foi durante um congresso da AIL – Associação Internacional dos Lusitanistas. Estava eu, já, um tanto tocado por ter reencontrado uma amiga recente, mas já muito querida. Além disso, estavam ali pessoas que já admirava – José Saramago, João Ubaldo Ribeiro, entre outros. A esse grupo juntou-se Ferreira Gullar, uma surpresa agradável, descoberta divertida – apesar de minha antipatia anterior inexplicada. Que homem divertido. Brilhante. Pois bem. Nesse congresso, numa das conferências matinais – as mais importantes então – adentram o salão nobre da sede da Universidade do Brasil, hoje UFRJ, na Praia vermelha, de braços dados, Dona Cleonice Berardinelli e Antonio Candido. Foi um delírio. A plateia, de pé, aplaudia entusiasmada. E eu, num cantinho do salão, chorava desbragadamente. Um cortejo de inteligência, importância, referência, para os estudos literários nos estados unidos de brunzundanga. Jamais esquecerei aquela cena. Como jamais esquecerei o sorriso de dona Cleo ao nos despedirmos, depois da entrevista em seu apartamento, no Rio de Janeiro. Houve ainda um último contato. Quando da realização de uma das edições de um projeto “Encontro marcado” – promoção conjunta da IBM com o Banco do Brasil. Fiz-lhe o convite para ir até Santa Maria. De início aceitou, mas dois dias depois declinou por orientação médica. Já estava bastante entrada em anos. Foi assim a minha história com essa mulher interessantíssima, admirável. Já não está, fisicamente. entre nós, mas é presença constante em nossa memória afetiva. Evoé!